23 de fevereiro de 2011

Baile de Carnaval em 1899

Arquivo da Biblioteca da Nazaré

Recordar o Zeca (3)

Os eunucos

(...)Não existe só o poder, a classe dominante, com o seu comportamento historicamente determinável. Existe também o consentimento de indivíduos que têm algumas responsabilidades intelectuais, ou políticas, com a atitude de deixar andar, que no fundo é uma atitude cúmplice. Eu tentei exprimir isso numa cantiga chamada "Os eunucos". Isto é um país de eunucos(...) Vão acabar por se devorar a si mesmos, como diz o Brecht.José Afonso


Os eunucos
in "Traz outro amigo também" 1970
Os eunucos devoram-se a si mesmos
Não mudam de uniforme, são venais
E quando os mais são feitos em torresmos
Defendem os tiranos contra os pais

Em tudo são verdugos mais ou menos
No jardim dos haréns os principais
E quando os mais são feitos em torresmos
Não matam os tiranos pedem mais

Suportam toda a dor na calmaria
Da olímpica visão dos samurais
Havia uma dona a mais na satrapia
Mas foi lançado à cova dos chacais

Em vénias malabares à luz do dia
Lambuzam da saliva os maiorais
E quando os mais são feitos em fatias
Não matam os tiranos pedem mais

22 de fevereiro de 2011

Recordar o Zeca (2)

Vida

Há amores que não prestam. O meu amor pelo Zeca foi sempre uma desordem. Não soube estar com ele, raramente o visitei quando adoeceu, não fui ao funeral. Passado quase um ano, encontrei a Zélia e desfiz-me em lágrimas. Fora de tempo. Escondi-me num portal até que o choro passasse, porque ninguém iria perceber. Toda a gente que estava com a Zélia tinha chorado na devida altura. Tinham feito o seu luto, tinham-no acompanhado, tinham guardado dele as coisas imortais. É o único modo de recordar em paz.
Eu não sei recordar, assim como não soube admitir que ele estava sujeito a definhar e a morrer, como nós. Que se acalmem as fúrias ortodoxas: eu não estou a fazer endeusamentos. Quero dizer que os faço, e muitas vezes, e que, sem deuses criados pelo afecto, pelo respeito ou pela imaginação, este mundo seria tão monótono, tão desinteressante como um yuppie a contar-nos o seu plano de vida.
Mas não. Não é por isso que falo assim do Zeca. Pelo contrário, o que nele sempre me impressionoum a ponto de conferir ao meu comportamento este ar inadaptado e doentio naquilo que à sua morte se refere, foi a imensa carga de humanidade que ele trazia consigo, que sobrava, para que à volta dele se alimentassem os que, mobilizados por um mesmo ideal, sofriam da secura que provocam a convicção excessiva e a tolerância.
A grandeza do Zeca era terrena e alegre e, acima de tudo, plena de inteligência. A luz que ele acendia em sua volta era uma luz sem dogmas, uma esperança tão limpa que às vezes não cabia na pequenez política. Com a revolução dele é que se havia de passar de século. Para que, além de justiça e liberdade, haja, isso sim, a boa gargalhada, o perfeito pedaço de poema, a busca, fora e dentro, do erro e do prazer.
Vi-o cantar a meio de um esgotamento, vigiado por pides. Acho que o vi com medo, e ele foi magnífico. Vi-o preocupado porque ríamos alto ­era um grupo de jovens levados pelo Fausto - e os filhos, pequeninos, podiam acordar. Vi-o chegar à porta da colectividade onde ensinava à noite, para nos dizer «olá» e voltar para a aula. Vi-o a correr descalço sobre a terra, entusiasmado e a pegar-me o entusiasmo pelas terapias alternativas. Vi-o, muito doente já, sem forças, a ler a poesia de S. João da Cruz. Como querem vocês que eu me ponha aqui a falar dele com elogios, como num obituário?
Olhem: nessa manhã em que ele morreu, eu passei num centro comercial. Foi lá que soube. As empregadas das «boutiques» estavam todas de preto e com cravos ao peito. Nos corredores e lojas só ressoava «Grândola». Sim: as empregadinhas das «boutiques». Sim: num vulgar e fútil centro comercial. Onde há gente novinha que não se interessa nada por História, que quer curtir e consumir por­que essa é a linguagem do gozo que conhecem. Gente que assim me deu essa notícia pela mais inesperada e comovedora das vias. Elas puseram luto e flores vermelhas porque o Zeca morrera, mas o que eu percebi foi que ele estava mais vivo do que qualquer pessoa sujeita às leis do tempo.
O ano passado organizou-se uma homenagem em Setúbal. Convidaram-me para uma conversa acerca do tema «Solidariedade». Pela primeira vez na minha vida, tive de pensar antes no que iria dizer. Porque uma só palavra, e tão séria, assus­tava. Felizmente, atenderam à minha timidez e chegámos ao fim sem que eu interviesse.
Quando saímos, respirei, aliviada. O Zeca, a filosofia do Zeca, a criatividade do Zeca, encontravam-se na rua. Nas ruas. Onde os jovens organizavam tudo, passavam com cadeiras, com festões de papel, com fatos de palhaço, e havia teatro,  música, e encontros, e discussões, e fome. Uma espantosa condensação de vida. Não há morte que chegue para tantos que respiram o ar que ele respirou.
 
Hélia Correia 
 

21 de fevereiro de 2011

Recordar o Zeca

Dia 23 de Fevereiro assinala-se o vigésimo quarto aniversário da morte de Zeca Afonso. Nos próximos dias publicaremos textos evocativos da grandeza do homem, músico e poeta que servirá sempre de inspiração à nossa colectividade.


Foi em Setúbal, um dia.
Foi um dia chuvoso, com algumas résteas de sol e vento, coberto de cravos e de espantos.
Havia no ar uma música própria do universo, tema, hesitante, mas impiedosa, tocada pelas sombras.
Tinham vindo cantores de Espanha, de França, e de todo o lado um mar de gente sem nome, numa última homenagem. Que mais podiam fazer? O Zeca permanecia ali, numa escola fria, aguardando a viagem.
Qualquer coisa de sagrado havia-se-Ihes escoado pelos dedos, a amizade, a música, anos passados em silêncio e outros em luta pela terra, em minas e nas grandes fábricas do ferro e do vidro.
Estava-se ali a ver desaparecer, devagar, pelas ruas, um pouco de todos nós, afinal alguém que não soubemos amar como merecia.
O Zeca ia-se embora, sem mais, por entre milhares de corpos e de pensamentos.
Quantas paixões e ódios deixou para trás é difícil saber. O Zeca era essa ponte de ligação entre muitas pátrias, entre muitas amarguras e vitórias.
Todos sabíamos que ele não morre nunca, mas, naquele momento, a morte era uma estranho pesadelo em que não se queria acreditar.
Fui vendo o Zeca em cantos livres, em cafés, pelas casas de amigos comuns, no meio de comícios de solidariedade com os povos do mundo inteiro.
Estive com ele atrás de palcos, trocando as emoções de quem gostava de mais dos homens e da vida.
Vi-o em sua casa, em Azeitão, mais tarde, umas vezes entristecido, outras cheio de esperança, falando de OteIo, de cooperativas, de poemas, de livros, de teatros e de Brel, apelando sempre para que os jovens não deixassem morrer a música e a poesia.
O Zeca era sobretudo um poeta, mais poeta do que músico. Também ele havia recebido a voz dos deuses para a espalhar pelas planícies e pelas casas.
Era um homem bom, inteiro, demasiado puro para esta vida.
E isso talvez o tenha morto tão cedo.


Rui Ferreira e Sousa 
 

Ecos do Carnaval de 1927

Arquivo da Biblioteca da Nazaré

Sugestão de Leitura


Monte Siano
texto de Hélia Correia





As fotografias apresentadas neste livro fazem parte de um trabalho realizado pelo autor em 2002, durante a Festa de S. Brás (que se realiza no dia 3 de Fevereiro), no Monte Siano (designação arcaica do Monte de S. Brás), na Nazaré.






"O registo revela o impossível: permite ver uma bacante em pleno transe sob um leitor de discos ou cassetes. Como se o tempo e o lugar se distorcessem, uma foto reúne ambientes que ninguém até então sonhou conciliar: a toalha não se acha sobre a mesa, o tapete não se acha no soalho, o cavalo avizinha-se dos pratos: a domesticidade deslocou-se e o pinhal, com o seu sujo, é uma casa. A menina da auréola olha com matreirice, pronta a crescer e a desafiar, numa terrena determinação. As noivas deambulam entre cardos, numa demanda totalmente alheia a uma bonomia conjugal. […]

A noite que vem cedo é entendida como um reforço na beleza das fogueiras. Aliada do caos e da embriaguês, naturalmente não afasta os celebrantes. Que temos nas imagens? A consequência do muito que bebeu o tocador que adormeceu, talvez, ou não consegue dedilhar já o seu acordeão. A menina que toma a cargo a música, como quem ergue na batalha o seu estandarte, só mãos e rosto e o chapéu contra o luar. Os corpos aquecidos pelo álcool e pela excitação a que a pin-up pregada ao tronco não será alheia. E há, enfim, o sorriso da mulher, envolta nos seus panos do oriente, a caminhar na nossa direcção. Saiu do fundo, carregada de beleza e de luz. Parece que o esplendor está dentro dela e que um novo começo é oferecido."
(Hélia Correia) 

17 de fevereiro de 2011

Discurso no 70º aniversário da Biblioteca

Discurso nos 70 anos da Biblioteca da Nazaré
(2 Abril de 2009)


Antes viver do que morrer no pasmo
Do nada que nos surge e nos devora…

                   Ary dos Santos


Longa se torna a viagem…muitos são os dias para quem cumpre 70 anos.

Com a Biblioteca partilhámos / partilhamos amores, amizades, lutas…impaciências. Com a Biblioteca edificamos sonhos, reconstruindo a forma da palavra cultura. Cultura entendida no seu todo, Cultura entendida como a forma mais livre da liberdade e da emancipação herdada dos valores de Abril…

Ao longo dos seus 70 anos a Biblioteca da Nazaré construiu a sua história. Forjou-se com a vontade indomável dos seus fundadores, dos inúmeros colaboradores que ao longo dos tempos fizeram do presente um lugar chamado futuro. Recordo aqui o Dr. José Maria Carvalho Jr. e o escritor Branquinho da Fonseca, parteiros do que somos hoje…recordo também  a presença amiga do arquitecto Tó Lança para quem nem a imensa distância geográfica o separou da sua Biblioteca. Recordo aqui todos os que fizeram da sua história pessoal grande parte da História Colectiva que celebramos hoje aqui.

Em muitos oceanos mergulhou a nossa colectividade…irmã insubmissa que em tudo tocou, pelo que é indissociável do percurso da nossa localidade. Fraternizada com os valores da modernidade e do progresso agarrou o livro como amor primeiro. Amou mais longe e fez do seu caminhar a pintura, o teatro, a alfabetização, a fotografia, a Feira do Livro, o Cinema, a música, a política no seu sentido mais generoso… A todas as crises sobreviveu, a todos os anátemas e ataques praticados por diminuídos intelectuais respondeu com a sua fidelidade ao espírito da convivência democrática e independência de ideias, uma forma de estar progressista que perdura.

Dr José Maria Carvalho Jr.

A família humana vive hoje tempos difíceis mas ao mesmo tempo interessantes…A cruzada individualista patrocinada pelos vários aparelhos ideológicos mergulhou-nos em uma crise de consequências imprevisíveis. Mais do que nunca as associações e as colectividades desempenham um importante papel, não apenas para suprir carências momentâneas mas sim, para contribuir para a transformação das nossas sociedades em organismos mais justos e solidários. Para encararmos o presente e o futuro importa recordar lições do passado: Cultura é Liberdade, Liberdade é emancipação.

Por nossa parte não iremos fugir ao futuro nem esperar pacientemente que ele aconteça. Se deixarmos o mundo entregue a si próprio ele não irá automaticamente ficar melhor. Importa neste ano de comemorações discutir o que queremos para a Biblioteca. Garantida a sua sobrevivência importa ampliar novamente as suas áreas de intervenção, divulgar a grandiosidade do seu património, das suas iniciativas. Garantida a sua sobrevivência importa agregar o conjunto dos seus sócios e simpatizantes e intervir em conjunto na nossa sociedade, combatendo a apatia e o obscurantismo.

O protocolo de cedência de instalações que assinamos aqui com o poder local, apesar da sua importância no aliviar do estrangulamento espacial que sofríamos, não pode ser entendido como uma panaceia, como um fim em si mesmo. Ele deve ser entendido como um ponto de partida para um melhor serviço para todos os que procuram as nossas instalações. Ele deve ser entendido como mais um espaço a explorar por todos no sentido de levar a cultura a todas as casas, a todas as ruas.

É com grande alegria que assinalamos os 70 anos na companhia de tantos amigos. Não sei o que nos reservam os próximos 70, contudo, observando todo este capital histórico e patrimonial, observando esta herança que se constrói todos os dias, faço minhas as palavras do Tó Lança:
 - É bom vivê-la.

Alexandre Isaac 

Notícias de um Carnaval em 1927

NOTICIAS DA NAZARETH - ARQUIVO BIBLIOTECA DA NAZARÉ

10 de fevereiro de 2011

Sugestão de Leitura



A actualidade dos textos de Orwell é assustadora. Num texto de 1946 sobre liberdade intelectual, qualquer semelhança com o presente não é mera coincidência


Não vivemos no meio de uma guerra, apenas de uma crise económica que faz outro tipo de vítimas, e já passaram mais de 50 anos, mas o mundo contado por George Orwell continua assustadoramente actual. O "Livros & Cigarros", recentemente editado pela Antígona, reúne vários ensaios do autor de "1984", um dos quais sobre a liberdade intelectual e a liberdade de imprensa. Apesar de escrito no período da Segunda Guerra Mundial, são inquietantes a actualidade e a oportunidade do texto "A Prevenção da Literatura", publicado em Janeiro de 1946 na revista britânica "Polemic". 

Diz Orwell: "O género de coisas que jogam contra ele [jornalista]" é "a concentração da imprensa nas mãos de meia dúzia de ricos"; "A independência do escritor e do artista vai sendo corroída por obscuras forças económicas"; "Os inimigos directos da honestidade e, como tal, da liberdade de pensamento, são os barões da imprensa, os magnatas da indústria cinematográfica e os burocratas"; e "Para exercer o direito de nos exprimirmos livremente, temos de lutar contra a pressão económica e contra franjas poderosas da opinião pública."

Podia ser hoje. Não é preciso pensar muito, basta olhar para os grupos de comunicação social, ver quem são os donos das rádios, dos jornais e dos canais de televisão, o que fazem e ao que vão. São sempre os mesmos, vão e voltam. Têm agendas próprias, cadernos de encargos e interdependências várias. Para além de, claro está, terem de dar lucro e, assim, satisfazer accionistas e, em parte, justificar a sua existência. É variado o que os move e o negócio é muito mais complexo, não vive apenas da verdade nem da liberdade de criticar. O jornalista não é livre e tem consciência dessa ausência de liberdade, segundo Orwell, "quando é obrigado a escrever mentiras ou a suprimir o que lhe parecem ser notícias importantes". 

Mas o mais grave, na opinião do autor, é que esta independência é, ao mesmo tempo, "minada por aqueles que deviam ser os seus defensores". Afinal, "os inimigos conscientes da liberdade são aqueles para quem a liberdade devia ter mais valor. Os cidadãos comuns estão-se nas tintas para a questão", nem tão- -pouco estão dispostos a fazer grandes esforços para a proteger, "não há uma corrente de opinião vigorosa". 

Orwell olhou à sua volta e citou, neste ensaio, o caso dos cientistas, admiradores acríticos da URSS, que pareciam não encontrar importância na destruição da liberdade, pois o seu campo de actividade não era atingido. "Quando assistimos à indiferença de homens cultos ficamos sem saber o que desprezar mais, se o seu cinismo, se a sua curteza de vistas", diz. Se há quem não se tenha dado conta, basta reler George Orwell: "Qualquer ataque à liberdade intelectual e ao conceito de verdade objectiva ameaça, a longo prazo, todos os sectores do pensamento." Podia ser hoje, também podia ser em Portugal.

7 de fevereiro de 2011

6 de fevereiro de 2011

"Cinema Paraíso"


Esta obra-prima do realizador Giuseppe Tornatore é um olhar nostálgico sobre a vida de um jovem na Itália do pós-guerra e o seu fascínio pelo cinema, tendo vencido o Oscar para o Melhor Filme Estrangeiro e o Grande Prémio do Júri do Festival de Cannes.

'Alfredo está a morrer'. Esta notícia surpreendeu o realizador de sucesso Salvatore (Jacques Perrin), levando-o a relembrar a sua infância e o tempo que passou na sala de projecção do cinema da sua vila, Cinema Paraíso.

Alfredo (Philippe Noiret), proprietário do cinema e projeccionista, foi um amigo inseparável do pequeno Salvatore, conhecido por 'Toto', à medida que este crescia na sua terra natal, uma vila devastada pelos horrores da guerra. O cinema oferecia fantasia e evasão ao habitantes da pequena vila, fazendo esquecer a dura realidade da fome e da pobreza.

Cinema Paraíso é um filme inesquecível e um maravilhoso tributo ao cinema que marcou uma geração inteira de espectadores.

REALIZADOR
Giuseppe Tornatore

INTÉRPRETES
Antonella Attili, Enzo Cannavale, Isa Danieli, Leo Gullotta, Marco Leonardi, Pupella Maggio, Agnese Nano, Leopoldo Trieste, Salvatore Cascio, Tano Cimarosa, Nicola Di Pinto, Roberta Lena, Nino Terzo, Jacques Perrin, Philippe Noiret.

5 de fevereiro de 2011

Bibliotecas são cada vez mais procuradas pelos jovens

As bibliotecas municipais e escolares em Portugal estão a ganhar importância como espaços privilegiados para utilização da Internet, revela um estudo europeu sobre crianças e riscos online hoje apresentado na Universidade Nova de Lisboa.Este foi um dos dados que surpreendeu a coordenadora nacional do estudo, Cristina Ponte, que reforça o potencial das bibliotecas como espaço a apostar para ensinar os alunos a fazer uma boa utilização da Internet.
Os investigadores presentes hoje no debate sobre os resultados do estudo foram unânimes em considerar que com a rede de bibliotecas escolares e com a presença - obrigatória há dois anos - de professores bibliotecários está aberto caminho para uma intervenção mais activa junto dos alunos.
Esta intervenção passa por dar apoio, controlar e ensinar a fazer um bom uso da Internet, nomeadamente junto dos jovens oriundos de estratos socioeconómicos mais baixos, que são, simultaneamente, quem tem menos apoio deste género em casa e quem mais usa as bibliotecas, por ter acesso à Internet grátis.
Segundo o estudo, a procura de bibliotecas por jovens portugueses para aceder à Internet é em Portugal o dobro da europeia.
As crianças procuram-nas como um espaço onde se sentem bem, tal como em casa, refere Cristina Ponte, acrescentando que há crianças com Internet em casa que ainda assim vão para as bibliotecas, muitas vezes com o seu portátil, para conviver.
«Este dado vem reforçar o potencial das bibliotecas, que deve ser pensado. As bibliotecas são locais de socialização e um potencial para intervenção activa em matéria de segurança», afirmou a investigadora.

Jornal o Sol, 4 de Fevereiro de 2011

Sugestão de Leitura


Esta é a história de quem, no momento mais árido da vida, se surpreende com a manifestação ainda de uma alegria. Uma alegria complexa, até difícil de aceitar, mas que comprova a validade do ser humano até ao seu último segundo. a máquina de fazer espanhóis é uma aventura irónica, trágica e divertida, pela madura idade, que será uma maturidade diferente, um estádio de conhecimento outro no qual o indivíduo se repensa para reincidir ou mudar. O que mudará na vida de antónio silva, com oitenta e quatro anos, no dia em que violentamente o seu mundo se transforma? valter hugo mãe nasceu em Saurimo, Angola, no ano de 1971. Licenciado em Direito, pós-graduado em Literatura Portuguesa Moderna e Contemporânea. Vive em Vila do Conde. Publicou três romances: o apocalipse dos trabalhadores (2008), o remorso de Baltazar serapião, Prémio José Saramago (2006) e o nosso reino (2004). A sua obra poética está revista e reunida no volume folclore íntimo (2008). valter hugo mãe é vocalista do grupo musical Governo (www.myspace.com/ogoverno) e esporadicamente dedica-se às artes plásticas.



«com a morte, também o amor devia acabar. acto contínuo, o nosso coração devia esvaziar-se de qualquer sentimento que até ali nutrira pela pessoa que deixou de existir. pensamos, existe ainda, está dentro de nós, ilusão que criamos para que se torne todavia mais humilhante a perda e para que nos abata de uma vez por todas com piedade. e não é compreensível que assim aconteça. com a morte, tudo o que respeita a quem morreu devia ser erradicado, para que aos vivos o fardo não se torne desumano. esse é o limite, a desumanidade de se perder quem não se pode perder. foi como se me dissessem, senhor silva, vamos levar-lhe os braços e as pernas, vamos levar-lhe os olhos e perderá a voz, talvez lhe deixemos os pulmões, mas teremos de levar o coração, e lamentamos muito, mas não lhe será permitida qualquer felicidade de agora em diante. caí sobre a cama e julguei que fui caindo por horas, rostos e mais rostos colocando-se diante de mim, e eu por ali abaixo, caindo, sem saber de nada. quando, por fim, me levantei, estava a anos-luz do homem que reconheceria, e aprender a sobreviver aos dias foi como aceitar morrer devagar, violentamente devagar, à revelia de tudo quanto me parecia menos cruel. e a natureza, se do meu coração não se esvaziou o amor pela laura, estaria numa aniquilação imediata para mim também, poupando-me à miséria de ver o sol que arde sem respeito por qualquer tragédia.
fica-se muito zangado como pessoa. não se criem dúvidas acerca disso. fica-se zangado e deseja-se aos outros pouco bem, e o mal que lhes pode acontecer é-nos indiferente ou, mais sinceramente, até nos reconforta, isso sim, como um abraço de embalo, para que não se ponham por aí a arder como o sol e, sobretudo, não nos falem com uma alegriazinha ingénua, de tempo contado, e nos façam perceber o quanto éramos também ingénuos e nunca nos preparáramos para a derrocada de todas as coisas. nunca nos preparamos para a realidade. passamos a ser cidadãos terrivelmente antipáticos, mesmo que façamos uma gestão inteligente desse desprezo que alimentamos crescendo. e só não nos tornamos perigosos porque envelhecer é tornarmo-nos vulneráveis e nada valentes, pelo que enlouquecemos um bocado e somos só como feras muito grandes sem ossos, metidas dentro de sacos de pele imprestáveis que já não servem para nos impor verticalidade nem nas mais pequenas batalhas.»


2 de fevereiro de 2011

A Caminho do Carnaval sem lamentos por D.Carlos

Leiria Ilustrada - Arquivo da Biblioteca da Nazaré




Poucos dias após o Regicídio de 01 de Fevereiro de 1908, na Nazaré as gargantas e os corpos afinavam-se para o Carnaval e ... para a implantação da República.