11 de abril de 2012

Em Abril Cravos Mil - Adriano Correia de Oliveira




Nascido no Porto e criado em Avintes, Adriano chegou a Coimbra em Outubro de 1959 para frequentar o curso de Direito, com apenas 17 anos, num tempo de agitação social propícia a impulsos e à mudança. Anos antes, a década de 50 – no pós-guerra – , tinha sido uma época marcada por fortes repressões. Só o movimento das eleições presidenciais de Humberto Delgado (em 1958) viria a ser “uma espécie de lufada de ar fresco”. Agora, “o país parecia mobilizar-se em toda a sua extensão, as pessoas tinham perdido um pouco o receio de falar”, recorda Louzã Henriques. Nessa altura começa também a surgir “um certo tipo de música, com as baladas, um certo tipo de leitura e de arte, factores que vão ter influência na forma de pensar o mundo”. E tudo isso chegou a Coimbra...
Na cidade dos estudante de então, o fado vivia uma época de mudança, com o contributo de cantores como Edmundo Bettencourt (fundador da Presença e que se tornou lendário como compositor e intérprete da canção de Coimbra) ou Artur Paredes. Mas Adriano “bebeu” outras influências graças uma geração de ouro: a de Fernando Machado Soares, que encetou a renovação do fado de Coimbra. “Havia um movimento de ideias muito intenso e profundamente dinâmico, propício à mudança”, refere o etnólo.
Em 1959, o então estudante de Direito inscreveu-se como primeiro-tenor no Orfeão Académico e, inevitavelmente, juntou-se às vozes do fado de Coimbra. A Academia e a cidade proporcionavam a Adriano novos horizontes intelectuais. Aí entrou em contacto com os problemas da sua geração, que eram os problemas de uma juventude em rota de colisão com o regime. Na década de 60 participou também no Grupo Universitário de Danças Regionais da Associação Académica de Coimbra e no CITAC – Círculo de Iniciação Teatral da Academia de Coimbra, onde representou várias peças.
Viveu, primeiro, numa residência de estudantes. No ano lectivo de 61/62 transferiu-se para a Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, voltando para a Universidade de Coimbra no ano seguinte. Passou então a viver na república Rás-Te-Parta que, em 1963 serviu de sede de candidatura à unidade democrática, concorrente para as eleições da Associação Académica patrocinada pelo Conselho das Repúblicas.
“Nessa época, as repúblicas eram “templos” de uma certa boémia tertulial. Ali chegavam as influências que corriam no mundo e as que ainda estariam nas próprias tensões criadas pelo ambiente político de Portugal. Discutia-se com grande à vontade”, recorda Louzã Henriques. “As repúblicas, os cafés e a própria organização associativa, neste caso concreto a associação académica, forneciam um campo de experiências, ao nível das artes, ao nível da afirmação de direitos, ao nível da afirmação da posição da academia em relação ao poder, o que começava a representar uma agitação de ordem intelectual”, relata.
Entre 1960 e 1980 Adriano gravou 90 títulos, deixando uma das obras musicais mais ricas da segunda metade do século.
Tal como outros músicos em Portugal ou no exílio, também Adriano Correia de Oliveira fez da música um acto de intervenção. A “Trova do Vento que Passa” , escrita por Manuel Alegre e por ele cantada, constituem uma referência ímpar das músicas de intervenção em Portugal contra o regime fascista e um hino do movimento estudantil.
Quando lhe faltava uma cadeira para terminar o curso de Direito, Adriano trocou Coimbra por Lisboa, trabalhou no Gabinete de Imprensa da Feira Industrial de Lisboa (FIL) e foi produtor da Editora Orfeu.
Na fase final da sua vida – Adriano viria a falecer a 16 de Outubro de 1982, com 40 anos, em Avintes vitimado por uma hemorragia esofágica – foi acompanhado à guitarra por Paulo Vaz de Carvalho (hoje docente da licenciatura em Ensino da Música na Universidade de Aveiro), que teve um papel fundamental nessa época. “Era muito rigoroso e um excelente artista e amigo”, lembra o médico.
Adriano nunca deixou Coimbra e, das muitas vezes que regressou, ficou hospedado em casa do seu amigo Louzã Henriques. O médico, que esteve quatro anos preso em Peniche por oposição ao regime, não acompanhou a vida académica de Adriano, mas a amizade, que nasceria naos mais tarde, permaneceu até ao fim dos seus dias. Hoje, quando fala do companheiro de luta e de sonhos, Louzã Henriques não esconde a saudade.
“Para a altura em que ele cantou certas coisas, foi um homem valente. Cantou coisas em que se afirmava, num tempo em que a repressão era muito violenta”, lembra o médico. Todavia, “encarou isso sempre com grande coragem, com grande postura. Não era um homem de inocências políticas. Era um homem que sabia perfeitamente o que queria e por que lutava. Nasceu para ser livre e para ser artista”.

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